Orientações para comprar produtos no exterior: quando é vantajoso, quais os impostos incidentes e como ter garantias de qualidade
Importar materiais tem sido estratégia cada vez mais analisada por construtoras em busca de alternativas à alta da demanda e dos preços de materiais de construção civil no Brasil. Mas para que a complexidade dos processos de importação valha a pena, é preciso equacionar fatores como volume a ser importado, prazo de entrega, qualidade, tipo de produto, adequação do material às normativas brasileiras, câmbio e taxa de importação.
Em geral, a compra de insumos de construção civil no exterior é indicada quando há alguma deficiência no suprimento local, como, por exemplo, indisponibilidade de materiais e equipamentos, tecnologia ultrapassada, baixa qualidade e custos elevados. A prática também é recomendada para combater eventuais abusos de preços no mercado nacional.
Artigos com alto valor agregado, como cerâmicas, ferragens e metais, que no Brasil têm preços elevados principalmente pela falta de fabricantes e pela diferenciação dos insumos, ganham preferência nos processos de importação. Gruas, elevadores de carga, cremalheiras e máquinas para execução de fundações, por conta da escassez da oferta nacional, somam-se à lista dos itens mais procurados para além da fronteira brasileira.
Cada um desses produtos é ofertado por mercados mais ou menos especializados e, consequentemente, com melhores ou piores condições de oferta em relação à realidade brasileira. Atualmente, os maiores parceiros do Brasil na comercialização de materiais de construção são China e Turquia, com foco em aço, tubos e produtos de acabamento. Já a Polônia é muito competitiva em vidros.
Mas num mercado dinâmico como o de vendas internacionais, nada é estático e as melhores condições devem ser analisadas caso a caso. Um dos fatores determinantes para a viabilização da importação é a taxa do câmbio, que por estar atualmente favorável à moeda brasileira, tem estimulado a importação de itens da construção. De qualquer modo, vale a regra: quanto mais valorizado o Real, mais competitiva a importação.
Outro vetor de análise é a quantidade de insumos a serem adquiridos. Para que o esforço de atravessamento do produto mundo afora seja viável, é preciso haver escala. Alexandre Oliveira, presidente da CompraCon (Associação de Compras da Construção Civil no Estado de São Paulo) e proprietário da DMO Engenharia, tem testemunhado essa condição. Para três obras em andamento, necessita de duas mil unidades de um determinado tipo de chuveiro com baixo consumo de energia. Por ser um material muito leve e pequeno, a quantidade pedida é insuficiente. A saída tem sido identificar outras construtoras que precisem do mesmo item para juntar as solicitações via CompraCon. "Empresa sozinha não consegue trazer produto de fora. Não é tão simples assim. Fica mais fácil comprar coletivamente", conta Oliveira.
E se até no mercado doméstico a entrega dos materiais tem demandado prazos cada vez mais elásticos, é de se supor que a questão tempo é variável crítica num contexto de logística transnacional. Por isso, as importações devem ser evitadas quando a necessidade do produto é urgente, indicam especialistas, uma vez que os prazos de entrega têm pouca precisão. Também há riscos com atrasos dos navios e demora por parte da Receita Federal em liberar a mercadoria. Em geral, o prazo médio para que os produtos cheguem ao País depois de feito o pedido dos materiais aos fabricantes é de 60 dias.
Compra intermediada
Mas talvez o fator mais crítico em todo o processo de importação seja a qualidade. Como os produtos não são avaliados in loco, o risco de se comprar materiais diferentes do esperado não está descartado. Nesses casos, uma possível troca levaria um tempo que a construção não poderia esperar. Para evitar isso, a solução seria manter um estoque alto, o que elevaria muito os custos. Outro perigo grave é comprar itens não conformes às normas brasileiras, contrariando a lei. (veja boxe Produtos importados devem atender normas brasileiras.)
Alternativa eficaz é fazer a compra via uma empresa especializada, as chamadas tradings. "O papel da trading é garantir o que está sendo comprado desde o pedido até a entrega. Se o produto não chegar totalmente de acordo com o pedido do cliente, o risco é assumido de forma integral pela importadora", comenta Basílio Jafet, diretor da área de material de construção da trading Comexport, que fechou recentemente acordo com a CompraCon do SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo).
Oliveira, presidente da cooperativa de compras, enfatiza que uma das maiores vantagens de negociar com uma trading confiável é a certeza de que não se comprará "gato por lebre", ou seja, a compra sairá a preço justo e deve chegar sem problemas a seu destino. "Existem muitos detalhes que emperram ou atrasam o processo de importação, como o acondicionamento em contêineres, uma eventual chegada do material em um porto fora do estado de origem da empresa, o que implica maior tributação, por exemplo. A ideia é que essa assessoria evite problemas dessa natureza", ressalta.
Além disso, para Oliveira, se comparada a uma compra conjunta, a alternativa de intermediação de uma empresa especializada preserva mais a relação empresa-fornecedor, evitando os inevitáveis desgastes de uma aquisição em grupo por eventuais discordâncias.
Pierre Tavares, diretor da empresa Linea Trading, especializada em comércio internacional, explica que como a diversidade de produtos importados no segmento de construção civil é muito grande, as tradings buscam identificar tendências do mercado. Isso acontece hoje com o aço, que já apresenta custos, em dólares, 50% abaixo do mercado nacional. "A facilitação da importação advém do conhecimento da trading de fazer as importações com agilidade e com redução de custos, por meio de incentivos à importação que a própria empresa detém e que podem ser repassados aos clientes", afirma Tavares.
Custos
Mas toda essa assessoria tem preço. Os valores cobrados pelas tradings pela intermediação nas compras são completamente diferentes de uma operação para outra e dependem de quesitos como volume, disponibilidade, transporte, impostos etc. Assim que recebe a consulta do cliente, a trading analisa as características do produto, como, por exemplo, sua classificação fiscal (Nomenclatura Comum do Mercosul, ou NCM). Esse é o ponto de partida para avaliar se o produto apresenta vantagens de preço em relação ao produto nacional.
Quando se tem a ideia clara do material a ser adquirido, a trading produz um estudo minucioso de importação, apresentado em planilha com mensuração de todos os impostos incidentes na operação, os custos aduaneiros e eventualmente reduções tarifárias que possam ser aplicadas ao produto. Os principais impostos pagos em um processo de importação são o II (Imposto de Importação), IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), ICMS e PIS/Cofins. Existem ainda custos de frete, fundo de reserva da Marinha Mercante, custos portuário e de desembargo da mercadoria.
"Procuramos adequar a necessidade de transporte com as melhores condições tributárias. Geralmente, as importações pelas tradings acontecem via uma carta de crédito, que atrela as especificações do pedido com o material que será importado. Também há políticas de incentivos estaduais, às quais se deve ficar atento. O Estado de Santa Catarina promove a redução dos impostos portuários para atrair negócios", explica Alexandre Nunes, gerente de negócios da Linea Trading.
Além dos custos para remuneração do fornecedor e frete internacional, o processo de importação prevê custos para a nacionalização. No caso dos vergalhões de aço, por exemplo, além dos impostos normais incidentes é cobrado um imposto de importação de 12%, como medida protecionista aos três fabricantes nacionais. As tarifas portuárias são bastante significativas.
A decisão de fazer a importação por conta própria ou por meio de um intermediário é livre e legal. O site da Receita Federal informa, entretanto, que tanto o importador quanto o adquirente devem lidar com os aspectos tributários dessas operações, para que não sejam surpreendidos pela fiscalização, sob pena de autuação e até mesmo apreensão das mercadorias. Hoje em dia, estão regularizadas pela Receita Federal duas formas de terceirização das operações de comércio exterior, conhecidas como "importação por conta e ordem" e "importação por encomenda".
Em relação à fiscalização da qualidade dos materiais, o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) funciona como órgão anuente, estabelece uma série de normas para a importação e certifica os produtos por meio de empresas acreditadas atestando sua qualidade. Antes de importar, todas as empresas devem verificar quais normas regulamentam os produtos solicitados. Os materiais e equipamentos que estão em processo de importação devem estar em conformidade com as Normas Técnicas Brasileiras da ABNT.
O acerto de equivalência quanto às certificações dos produtos comercializados pode ser feito previamente, entre as empresas adquirentes e os exportadores, segundo regras técnicas já estabelecidas pelas normas oficiais de cada país.
Produtos importados devem atender às normas brasileiras
Na avaliação da qualidade dos materiais importados, o fator adequação dos itens às normas brasileiras é condição para a importação. Antes de efetivar a compra, é imprescindível verificar quais normas regulamentam os produtos solicitados. Com base nessa informação, é possível checar se os itens estão em conformidade com as Normas Técnicas Brasileiras da ABNT (Associação brasileira de Normas Técnicas), como manda a lei.
O ideal é estar sempre em contato com um laboratório nacional capaz de orientar quanto aos ensaios necessários para cada tipo de produto e as normas que tanto os materiais quanto os equipamentos têm de atender. "Existem organismos internacionais acreditados pela OMC [Organização Mundial do Comércio] que atestam a qualidade dos produtos embarcados. Se a compra for bem conduzida, praticamente não existem riscos", afirma Sarkis Nabi Curi, presidente da CBIC e da Comat (Comissão de Materiais e Tecnologia). Todo e qualquer produto importado deve passar pelo crivo do Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial), que certifica os produtos por meio de empresas acreditadas atestando sua qualidade.
Recentemente, a questão da normatização de produtos estrangeiros provocou polêmica no porto de Vitória, Espírito Santo. No dia 12 de dezembro, uma carga de 15 mil t foi retida no cais de Capuaba e, a pedido do Instituto Aço Brasil, a Justiça brasileira instaurou uma ação cautelar de produção antecipada de provas para apreensão da mercadoria e realização de prova pericial. Um laudo preliminar do perito José Lage Moreira apontava uma série de problemas na carga, como falha de padrão nas bitolas dos feixes de aço, todas fora das especificações do Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial), e trincas nas barras de 10 mm quando submetidas ao ensaio de dobramento.
Entretanto, o Instituto Falcão Bauer confirmou ter realizado ensaios de aço na Turquia e atestado de boa qualidade do produto na época, e está tomando todas as medidas necessárias para apurar os fatos. "Em função de denúncia recebida, efetuamos uma amostragem de todo o material retido no porto de Vitória e enviamos a um laboratório acreditado para realização dos ensaios necessários", explica Paulo Facchini, gerente de certificação do Instituto Falcão Bauer. Atualmente, o instituto está com um auditor e especialista na Turquia para realizar nova auditoria e novos ensaios para a manutenção da certificação.
Entidades organizam importação conjunta
A importação de materiais via entidades de classe pode facilitar o processo de aquisição de mercadorias no mercado internacional. Na CompraCon (Associação de Compras da Construção Civil no Estado de São Paulo), a importação é intermediada pela trading Comexport e engloba insumos como aço e tubos e produtos de acabamento, porcelanato, louças e metais sanitários, entre outros. Cada construtora associada ao CompraCon negocia separadamente com a Comexport, acertando diretamente todos os detalhes de um ou mais produtos a serem adquiridos. O convênio garante um preço melhor no tocante à taxa de serviços, cobrado de acordo com o tipo de insumo e volume negociado.
Já na CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), que no ano passado convocou construtoras interessadas em participar da importação de vergalhões de aço CA-50, o modelo de compras prevê que os produtos sejam escolhidos por meio das Coopercons (cooperativas criadas para atuarem como braço de negócios da CBIC). Esses coletivos detectam junto às construtoras as necessidades ou anomalias de mercado. Se a importação for viável, são formados pacotes de compras com as construtoras interessadas.
Por Vinicius Abbate, via Construção Mercado